Lúdico na EAD

Entrevista de Martha Sutter concedida ao Programa Educativo da TV FIRJAN¹.

Sabemos  que o jogo, por definição, é visto como uma atividade recreativa, voltada à diversão, ao entretenimento. Fale um pouco sobre a teoria que envolve os jogos na nossa sociedade.

Para se compreender o uso de jogos nos projetos de ensino a distância, é fundamental entender o que o jogo significa, sua relação com o aprendizado e finalmente sua aplicação na EaD.  O jogo pode ter duas classificações, ser “de movimento”, que envolve um grande esforço físico e destreza; e “sedentário”, onde predomina a atividade mental – combinando conhecimento, múltiplas inteligências e, até mesmo, a sorte.

Os jogos podem ser individuais, a dois, ou em grupo, agregando os componentes: socialização, espírito de equipe, desafio, competição e aprendizado.
É por isso que se diz: ” que é brincando é que se aprende”?

Diferente da brincadeira, que pode ser bastante livre, o jogo exige o respeito às regras. Apesar de sua aparente “falta de seriedade”, o jogo possui um papel fundamental no desenvolvimento humano. É através dele que ocorre a inserção social, aquisição de valores culturais, desenvolvimento da maturidade psicológica, a tal ponto que se pode afirmar que jogar é viver.

Qual o aspecto educativo dos jogos?

Friedrich Fröbe ², criou em 1840, o Jardim de Infância. Ele considerava que a instrução da criança e seu desenvolvimento dependiam da autoatividade, entre elas as atividades espontâneas – os jogos. Com isso, ele mostrou o valor educativo do jogo. Os conceitos de Fröbel influenciaram os fabricantes de brinquedos e a indústria do entretenimento. Os jogos, que já se firmaram no mundo corporativo, são conhecidos como jogos de treinamento/capacitação.

Exemplos é que não faltam. Vou citar dois casos que possuem uma pesquisa quanto ao retorno da capacitação e interesse dos usuários. A Canon, por exemplo, utiliza os jogos na formação de técnicos, sendo que 5% a 8% mostraram melhorias de atuação em comparação às formas de treinamento feitas com manuais. A Cold Stone, uma sorveteria da Califórnia (com lojas em mais de 20 países), disponibilizou um jogo na intranet da empresa e 8.000 funcionários (30% dos colaboradores), baixaram o jogo voluntariamente na primeira semana. E que jogo era esse que atraiu tantas pessoas? Melhoraria no atendimento ao cliente.

O que tem havido de pesquisa sobre os jogos no Brasil?

No meio acadêmico, a Profa. Lyn Alves da UNEB (Universidade do Estado da Bahia), desenvolveu tese sobre os jogos eletrônicos e a violência entre adolescentes. Uma temática de grande interesse para as escolas. Nas UFSCar (Universidade Federal de São Carlos) e UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) desenvolveram um software educacional com base nos conceitos de jogos em computador.

Quais os pontos positivos do lúdico no processo de aprendizagem?

Algumas das razões podem ser:

  1. As pessoas preferem realizar atividades que tragam prazer e divertimento. O jogo pode reunir, justamente, os aspectos do entretenimento e do conhecimento em uma mesma atividade. Realizamos melhor as tarefas em um contexto descontraído. Por isso o emprego do jogo é muito positivo, pois ele ajuda a relaxar.
  2. O jogo requer uma constante tomada de decisão do usuário. Se adéqua muito bem na resolução de problemas, como em estudos de caso, nas simulações de situações reais, nas analises estratégicas. Também pode atender a diferentes níveis de usuários na escala hierárquica das instituições.
  3. Sem que o aluno/usuário esteja confrontado a um processo formal de avaliação, ele poderá averiguar, por si mesmo, seu autoconhecimento por meio do desafio. O erro só o faz se empenhar mais para prosseguir jogando e conquistar a próxima etapa.
  4. Re-estudo espontâneo: existe a grande possibilidade do aluno querer refazer o jogo, pelo simples prazer de jogar e poder melhorar o seu desempenho.
  5. Permite e pessoa lidar com a emoção no processo da aprendizagem.
  6. Além da analise das informações e escolha da resposta correta, faz-se uso de múltiplas inteligências:
  • Inteligência verbal – compreensão de texto.
  • Inteligência espacial – atuação no cenário virtual proposto.
  • Inteligência sinestésica – destreza no manuseio do mouse.

Martha, e como fica a relação do jogo com a EaD?

Os cursos em EaD não são apenas telas digitais informativas. É um erro solicitar às pessoas que participem do estudo como um mero passador de páginas através de um clique de mouse, sem que elas tenham que refletir, participar, decidir.

Uma forma de motivar as pessoas a estudar é fazê-las interagir, atuar, contribuir. E um dos pontos sensíveis do estudo a distancia é conseguir provocar tal motivação no participante, para tanto deve-se criar um ambiente envolvente, com conteúdo de qualidade, visualmente claro, de fácil navegação, capaz de provocar e reagir às ações do usuário. Com tal atratividade consegue-se a participação ativa do aluno. Os jogos digitais ou online são uma ótima ferramenta neste sentido segundo Rheingold 3.

Para um melhor entendimento, os componentes dos jogos digitais são: contexto, enredo ou trama, motor e interface.

  • Contexto:- situação em que ocorre a ação.
  • Enredo: traduz o objetivo do jogo. Deve ser instigante, quanto mais bem redigido maior o envolvimento do participante.
  • Motor: programação que confere a animação. Controla a interação entre o usuário e a interface do jogo.
  • Interface interativa: palco de ação do jogo, a representação imagética do enredo e do andamento do mesmo.

Tal estrutura requer diversos profissionais das áreas de educação, animação, design e programação.

Que conselho final você que poderia nos dar?

Formas inusitadas de aprender sempre existiram e dependendo da proposta se adaptam a diferentes pessoas, independente da faixa etária. Além disso devemos prestar atenção às novas tecnologias pois elas podem nos acrescentar um ferramental muito importante para aprimorar o que já realizamos de um modo mais tradicional. É sempre bom poder fortalecer nossas competências conhecendo e empregando um novo campo de atuação.

Quanto ao aspecto lúdico, jogar é uma atividade em que nos sentimos muito confortáveis, na qual agimos com naturalidade, afinal gostamos de jogar desde a infância. Enquanto que os jogos corporativos permitem abordam situações mais delicadas levando à maturidade profissional.

Notas ——————————————————————————–

1 – Esta é uma entrevista que participei no programa educativo da TV FIRJAN, para explicar os aspectos do lado lúdico nos cursos em educação a distância (EaD). Fui entrevistada pela Profa. Maria Serrate, com participação especial de Anderson Mansera, designer gráfico, ambos do Departamento de Educação da FIRJAN, na época.

2 – Friedrich Fröbel – pedagogo alemão, nascido em 1872. Suas ideias reformularam a educação. A essência de sua pedagogia se centra nos princípios educacionais da atividade e da liberdade. Trabalhou com Pestalozzi e, embora influenciado por ele, foi totalmente independente e crítico, formulando seus próprios princípios educacionais.

3 – Howard Rheingold –  professor e escritor norte-americano, nascido em . Criador do termo “comunidades virtuais”. Sua especialidade diz respeito às implicações culturais, sociais e políticas dos atuais meios de comunicação (Internet, telefonia móvel). Ele afirma que os jogos de RPG on-line, em especial, permitem a troca de novos conhecimentos, fomentam a criação de comunidades virtuais.

Referência bibliografica ——————————————————————————–

A Pedagogia na Era das revoluções – uma análise do pensamento de Pestalozzi e Froebel
ARCE, Alessandra
Ed. Autores Associados

A psicologia da criança e a pedagogia funcional de Edouard Claparéde e a pedagogia dos jardins de infância de Friedrich Froebel.
ARCE, Alessandra – Universidade Federal de São Carlos/UFSCar  – alessandra.arce@uol.com.br | Rosimeire Simão – USP
Ed. Revista HISTEDBR On-line

The Virtual Community: Homesteading on the Electronic Frontier
RHEINGOLD Howard
online version
http://www.rheingold.com/vc/book

Links ——————————————————————————–

http://www.canon.com

 

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